A inocência é a universalidade dos seres vivos, é nela que está a beleza da ignorância de quem vive acreditando.

A minha inocência foi esta:


Francisco Sarmento

Este blogue encontra-se concluído para que outro aconteça agora: http://poemasdesentir.wordpress.com/

sábado, 26 de novembro de 2011

Olá,

o meu nome é 86 389 098 da estatística da pobreza,
nele basearam-se para criarem leis e regras,
caminhos vazios e mais trezentos destinos
menos o destino do qual afirmaram com toda a certeza.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

A flor amadureceu à medida que a minha infantilidade ia, tão lentamente, tão subtilmente, escapando-se de si própria... e na minha própria mão as suas raízes fundiam-se com os traços da minha face escondida na mão. Ela, ainda contendo apenas uma pena, reflectia uma viciante beleza eternamente mítica, eternamente mística... Alimentava-se dos sentimentos que faziam fechar e apertar a minha mão de uma força contrária à força da transformação que torna uma mulher mãe. Conhecia-a tão bem, já conseguia adivinhar o tempo e sabia perfeitamente onde estavam os astros. Tornara-se num ciclo diário fechado, óbvio, banal...
A qualquer momento a culpa passou a ser minha, eu dei o Presente ao Futuro vivendo com os rastos e os restos do Passado... se alguma vez as palavras tiveram significado então transformaram-se em palavras ditas por um péssimo actor, de uma palete monótona, de expressão forçada... e todas as cores passaram a ser vistas na escuridão, iguais, sem hipóteses de haver gostos... e o sol e a lua e tudo o que os rodeia passou numa janela de um comboio que bazou sem destino...

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Tédio

Sentado no sofá
a ver o tempo passar lentamente,
não que queira passar para o lado de lá
mas sim por não ter nada em mente.

sábado, 19 de novembro de 2011

Maturidade

(...) porque o sofrimento requer o exercício da reflexão e sem nos apercebermos, por estarmos afogados nas lágrimas, começamos a reflectir intensamente, porque um problema não foge, é como um fantasma, acompanha-nos até nós descobrirmo-lo e sofremos por termos descoberto o problema e no meio disso tentamos achar uma solução, mas nada parece ter força, nada parece razoável, nenhuma acção deste mundo consegue pôr o nosso próprio cosmos em ordem e sofremos ainda mais, como se estivéssemos num poço escuro e gélido, tão profundo que deixamos de ver a luz do sol, aquele resto de luminosidade que nos guiava e dizia por onde sair e andamos ás voltas, na escuridão de um poço, a bater com força nas paredes procurando uma saída que não há e, cansados, desistimos e deitamo-nos no chão à espera que a morte nos venha resgatar, alucinando memórias felizes que nunca aconteceram, entre a fome desesperante de um simples abraço e a sede da troca de amar e ser amado, acabando por adormecer... e quando acordo, ao meu lado está uma bela e mágica pomba de penas brancas que iluminam uma parte do que estava escondido na escuridão, observando-me em silêncio à espera de uma minha acção mas o medo, os traumas que se tornaram experiência de vida criam hesitações e barreiras e escavam a cova. A pomba dá às asas e voa, voa para o céu mais alto obrigando-me a olhar para cima e, nesse momento, o meu peito alimenta-se das estrelas erguidas num mistério inalcançável e aí, a palidez ganha uma nova cor e recomeço a erguer-me do chão para um novo e diferente início. Numa luta incessante, de uma determinação extraordinária que faz cravar bem fundo os meus dedos nas paredes do poço, escalando com determinação, tendo como objectivo um lugar na superfície da Terra. A cada queda que dou, a revolta torna-se maior e maior e maior e maior... cada célula vai-se transformando num pedaço de monstro a cada centímetro que subo. A umas dezenas de metros da superfície, já todo eu transformado num mostro, com uma voz esganiçada pela raiva, com os olhos vermelhos de lágrimas que fervem, começo a expulsar o ódio entre ameaças temerosas... Chegado à superfície, irreconhecível, a revolta ganha atitudes e acções, a vingança de uma vida requer a ordem natural das coisas... a raiva, o ódio... tudo se perde quando um espelho se atravessa na minha frente e o choque do que vejo faz-me questionar no que me tornei eu... num monstro que afastou qualquer gesto... qualquer palavra de amor... todas estas questões trancam o monstro dentro de mim, porque quase ceguei... e então, sento-me na minha cama, pego o meu álbum de fotografias pousado na mesinha de cabeceira ao lado da cama e começo a folheá-lo recordando-me de tudo, de todas as memórias, de todos os meus pensamentos, de tudo o que fiz e me aconteceu... e todas as minhas misérias e desgraças dão vontade de rir, chorar de tanto rir, rir até não poder mais, rir até me deitar na cama e agarrar-me as dores dos abdominais e quando me acalmo, um sorriso se esboça para que no final diga: a sério? Levanto-me da cama e vou-me embora viver com as células que ainda me sobraram.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011


Estive dentro da tua mente,
nesse teu campo de concentração.
Ainda hoje sinto a sua respiração,
era tão nojento... tão repugnante...
abafado pelo cheiro da dor.
De tão asfixiante que era,
até mesmo de olhos fechados
conseguia ver cada pormenor de cada corredor:
o sangue raspado nas paredes,
ainda fresco, da carne desfeita em sangue
das caras que te afrontaram com a verdade,
raspadas nas paredes até ficarem só osso.

Ainda sinto o cheiro a lutas inúteis
contra o gás abafador do teu orgulho
nas câmaras... nas câmaras de gás,
onde a impaciência se exaltava
e se aclamava o silêncio da morte,
o silêncio que nos leva sem nos trazer...

Eu caminhei  naqueles corredores húmidos,
dos seus tectos pingava água,
eram gotas de lágrimas, formavam poças...
delas, ecoavam gritos de ódio e tristeza
a cada trémulo passo atingido no chão.

No andar acima, torturas amarradas a cadeiras
dão forma à figura do horror
através do cheiro nauseabundo de pragas roucas
em pedaços perdidos numa imensidão de sangue seco.

Eu te digo, o inferno existe
e nele não há qualquer forma de esperança,
apenas reina o desespero e o medo,
a mentira de vida e a clemência pela morte.
É uma nuvem carregada
de relâmpagos tempestuosos,
incendiários de árvores férteis.
Num céu superior
jorra de si águas poluídas e ácidas
secando a mais bela flor.
É uma onda gigante
que, por onde passa,
semeia a desgraça,
onde devia ter nascido
memórias de um amor.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Bem te vejo, ó nuvem,
e como barro, te manejo
tão grosseira e bruscamente
arrancando-te os fatos de anti-ser
para atingir o finalmente.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

As pedras da calçada
sentem a leveza do terror
de um olhar fixado no interior
vendo nada do que é o seu redor.

Um impedimento consciencializado
não ganha resolução no coração
atormentando numa mentira...
os olhos querem abrir e sair deste horror 
mas o maior pesadelo duma mentira está em vê-la 
e não conseguir deixar de vivê-lo.

E eu sei, sei tão de cor
as letras da verdade desonesta,
tão certas como a água que vejo e saboreio
mas escorrega sempre das minhas rotas mãos
e quanto mais as fecho mais depressa me foge...
forjando espelhos de água deturpados.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Beethoven Sinfonia 05 Sonata 14 (Moonlight)

Acabaram-se as palavras,
os sonhos e as esperanças.
Já não há ventos nem espaços
não há silêncios nem tempos.
Morreram as árvores,
os artistas, as flores,
os céus, as núvens ténues…
É o fim da criação,
o choque da evolução.
As circunstâncias
destas estrelas
são cereais
saboreados
ao pequeno almoço,
são conversas banais…
Cidade sem alma,
aterrorizada subtilmente,
ignorada, desprezada
por formigas
ligadas a fios eléctricos,
que caminham
com pensamentos estéticos.
.
Já não há telas brancas
nem folhas limpas,
o tempo é o relógio que o dita,
os horários fazem dos vivos mortos
e a noite é dominada pelo
desprezo.
A paisagem correu
na viagem de comboio
onde o tempo passa
esperando passar rapidamente,
se é que a paisagem já não morreu,
será que ela não existe
ou serei eu?
Eu, que sem alma
me encontro nesta cidade desencontrada,
que compra o amor em pacotes de plástico reciclado
sem saber de onde veio,
que acha saber sem viver
senão num comboio alimentado,
não pelo sonho, não pela esperança
mas pelo prazer mundano dos vícios
do acolhimento palpável
e materializado, falsamente materializado…
Somos bebés amamentados por chupetas
crescidos na deformação do amor
desconfiados de sabor…
somos nós as formigas
que trabalham para serem pisadas,
tão arduamente na casa de alguém,
de um rei qualquer que desconhece
a nossa existência,
a nossa tradição e cultura…
Somos galinhas secas
de muito sabemos contar
tão gordas de mentiras
condenadas a não saber voar…
A única glória é a mentira
de uma história contada
por nós, protagonistas falsos,
contada por alguém que de nada
tem do que podemos dizer ser nosso,
despegado de fantochada.
Vivemos nos calabouços dum castelo
feito de gente pisada como cartas,
numa tentativa absurda de ter importância
subindo escadas de degraus,
ou antes números de pessoas,
sim, massacrar a ganância
com ganância.
É esta a hora em que a fome
se tornou um prazer,
a morte um caminho presente
que tentamos tão desordenadamente
fingir não ser connosco a idade
avançada de memórias
guardadas em masmorras,
presas numa qualquer saudade
inexistente, puramente imaginária,
um total plágio do fracasso escondido,
amando o desconhecido mas real,
puro irreal mas sentido
um descobrimento fatal
de um destino
que aos comuns é sempre igual…