Diz-me tu o que não é ilusão...
quando as marcas estão em chão abstracto
dissolvido num filho parido morto,
que outrora significara tudo,
sorrisos e esperanças,
sonhos e promessas,
mas a morte foi dada à luz
e o amor foi dispersado...
amor, outrora era tudo,
agora traição e o nada vazio...
vazio como a casa que assim se tornou pelo amor dispersado,
como tinta atirada de um balde para uma tela,
passando a ser um quadro...
um mero acessório de uma casa abandonada
onde toxicodependentes vão-se drogar
desprezando totalmente a ferida dos iludidos...
não há porta e a prostituição é constante,
e dormem lá os oprimidos das chuvas e dos frios...
é a casa dos cantos,
onde desgraçados se encostam
sobreviventes à morte que o desprezo causa,
abraçados pelo mundo só, fugitivos da socialização,
re-criadores no silêncio de uma vida vazia
e de memórias que os matam lentamente...
esta é a casa de ninguém,
onde os humanos que não existem
são repousados à espera do fim,
todos os vividos de uma vida feliz
tornada irreal, por agora ser nada,
como se a morte fosse tão desumana
ao ponto de deixá-los vivos...
cemitério, esta casa cheia de pessoas vazias
que não têm palavras para falar sobre o nada que são,
sobre o "em vão" que são as funções das coisas,
os nomes das coisas e as suas consequências...
a casa dos invisíveis,
onde as verdades afinal são mentiras
e o tempo não é tempo...
e a importância afinal não é importante...
e os desejos não se desejam....
e os sonhos não são sonhados...
não é mansão, só três divisões
estão intactas cobertas por um telhado meio,
e uma escadaria destruída que leva
os alucinados às estrelas
- por causa das alucinações
da fome e das drogas alucinogénas
e também porque depois do último degrau
está um precipício comedor de cadáveres caídos -
casa das luzes desligadas,
cova humilde e confortável para quem a Humanidade se desligou,
para quem o brilho do olhar é um pavio queimado,
para os pés das pedras gastas e para fósforos usados...
mas vieram cá os homens da gravata
penhorar o símbolo da casa,
o único símbolo que os tornava reais,
a única arte que os representava:
o quadro cuja a tinta era sangue...
É o fim.
Não há forma de vida,
a morte nada tem a fazer aqui.
A casa torna-se oca, sem esperança,
pelas mãos dos que estão à margem da Humanidade:
os cabrões dos capitalistas.
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